VOAR COMO UM PASSARINHO

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VOAR COMO UM PASSARINHO


Acordei nostálgico nesta manhã. Num arbusto, junto à janela da nossa casa, no quarto de minha mulher, Anny, um passarinho fez um ninho, e ali estão dois filhotinhos aquecidos pelo corpo da mãe. Vemos a mãe voar entre as flores do nosso jardim, colhendo o alimento para os recém-nascidos. Choveu na madrugada fria, sei que ela cobriu os filhotes com seu corpo, para aquecê-los. O ânimo voltou. Recordo os hinos que minha mãe cantava desde a minha mais tenra infância. Olha que já vai tempo! “Passarinhos, belas flores, querem me encantar”. São esplendores comuns, mas é dali que contemplo o meu saudoso lar. Estou um pouco cansado, perturbado com a repetição de acontecimentos nefastos que perturbam a alma de qualquer um que observe os desmandos, pregação do ódio ideológico, violência contra os mais fracos e desprotegidos, destruição das esperanças do povo. Dias de trevas, dias de aflição que parecem nunca terminar. Tenho saudade dos passarinhos, de Luiz Vieira cantando: “Sou menino passarinho, com vontade de voar”, das flores, dos esplendores da natureza verde, e dos meus verdes anos.
Contemplo o meu primeiro lar no alto das montanhas onde nasci e cresci numa casa de imigrantes italianos. Clima frio no nas montanhas capixabas. Descubro que por toda a vida tenho sido um montanhês. Qual passarinho saudoso do ninho, quero ir para os altos montes, voltar do exílio que a vida me impôs. Meu coração está com pressa. Como um passarinho, quero já voar para o meu refúgio. Caminhar ouvindo meus próprios passos soando antes de chegar o escuro véu da noite. Desprezei o relógio que sempre carregava comigo, que me alertava o tempo todo para o tempo que não deveria ser perdido com coisas mais simples. Tornei-me desobediente, as coisas simples apontam para a humildade que se deve ter diante da grandiosidade que nos cerca. Para observar o tempo, basta-me o sol que desponta depois da madrugada enevoada no lugar onde moro agora, começando a cada dia. “Tempus fugit”, sei que o tempo foge, mas nossas histórias não estão registradas num simples relógio. Porém, sei que o relógio não desiste, o tempo vai sumindo no horizonte, como a fumaça do cigarro que não fumo já há muitos anos. Então, o sol vai desaparecer logo, depois da tarde, e mergulhar nas sombras da noite. Preciso me apressar, talvez correr, para não perder de vista a beleza única do pássaro que pousa na janela do quarto de Anny, no amanhecer, depois de cuidar dos filhotes recém-nascidos. Maravilhosa companhia para começar o dia.

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