Faustino Teixeira – Anotações

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A Sociedade do Cansaço  –  Vozes
Trecho:
ROMPER COM OS LIMITES INSTITUCIONAIS DA RELIGIÃO
Numa sociedade do cansaço é necessário momentos de silêncio, pausas, interrompendo o ciclo de violência da vida produtiva, numa sintonia fina com aquilo que vc está habituado a viver. Fazendo jardinagem, podemos ver que a vida contemplativa exige uma pedagogia do ver. Devemos aprender a ver, pensar, falar e escrever. Uma cultura distinta, habituar o olho ao descanso, à paciência, deixar aproximar-se de si o essencial. Um olhar demorado e lento. Precisamos ampliar o conceito de “nós”, para além do ser humano. Ampliar nossa memória para aprender com aqueles que vivem a experiência da regeneração. Regenerar esse tempo violento do antropocentrismo. Uma ecologia que abranja os outros em si mesmos. Não apenas nós em nós mesmos. Aberturas e interrelações (Papa Francisco). A vida não pode estar encerrada dentro dos limites das formas fixas. Uma separação entre natureza e cultura (religião e a vida). O habitat humano se dá num entrecruzar de linhas. Como é a natureza. Nós, seres humanos, vivemos num emaranhado de múltiplas relações.
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CAMINHO NUM EMARANHADO INFINDÁVEL
Encontro-me cercado por ruas e avenidas de teias e filamentos,
Sei são fungos que criam essas avenidas e ruas, teias, debaixo da terra.
Agindo ao redor das raízes das árvores,
Formando estruturas conjuntas de fungos e teias, micorrizas,
As teias se conectam através de filamentos fúndicos,
Juntando tudo num emaranhado infindável na floresta debaixo do chão.
Já disseram: fungos e cogumelos não têm rosto, mas têm vida,
Têm uma energia vital, uma liberdade,
uma criatividade espantosa,
Uma cidade que surpreende qualquer observador.
Tudo isso debaixo dos nossos pés.
Isso convida a ampliarmos nossos olhares,
Porque pensamos que isso se dá somente
Como seres humanos, erradamente…
Voce precisa saber, como aprendi,
Que, quando você corta uma árvores,
Ou não se importa com predadores
Que devastam e queimam florestas,
Você está transformando o ritmo desse emaranhado
De redes e teias de vida e energia.
Precisamos aprender que somos habitados por esses mundos.
Mundos no chão das matas, que estão sob nossos pés,
E que estão ao nosso lado, e que ampliam a cadeia do “nós”…
“Nós somos da terra, e da terra vivemos”…

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POEMA PARA ANNY
Foi embora a luz mortiça da tarde crepuscular
Na noite iluminada que há muito escondeu o breu
Chorei por dentro com medo de nunca mais te ver
Aprendiz da vida, nunca aprendi a conviver com o tempo
E temi que a máscara de oxigênio não fosse suficiente
Para garantir que viverias para que de novo
Voltasses aos braços meus, e pudesses receber outra vez
Meus beijos, e de novo poder estreitar teu corpo
Com o carinho do meu amor, perdido em teus braços,
Perfumados com o cheiro molhado que teu corpo exala
Vi, então, a vida passar olhando-a como se olha o calidoscópio
As peças mudando de posição a cada movimento
Para os lados, para baixo, para cima, mas sem perder
O brilho das cores em cada peça e em cada desenho
Que se forma na dança das cores que não se repetem
Por mais que insistamos em reformar as imagens já vistas
[*]
Uma vez pensei: não tenho medo do tempo
O tempo é que deve ter medo de mim
Porque toda vez que dele me aproximo
Ele foge como a areia que escorre entre meus dedos
Quando minha mão que se abre sem querer abrir
O tempo é também uma viagem numa estrada sinuosa
Que jamais tem fim.
[*]

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